sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Pecado é uma...

Imagine uma linda, extraordinária, magnífica, estonteante escultura, porém feita de um material não muito usual: excremento humano fresco. Nela estão diversas fezes das mais variadas colorações. Vários tons de marrom. Outras mais negras. Outras mais amareladas. Alaranjadas. Acinzentadas. Verde abacate. Outras até em lindos tons de violeta. Os mais diversos matizes e nuances de cores e texturas, dispostas de maneira tão criativa e engenhosa, com tão inebriante bom gosto (um paradoxo, quando lembramos de que material é feita) que se torna humanamente impossível não admirá-la extasiado. Cada detalhe nos enche os olhos e a transforma numa obra espetacular e primorosa. O pecado é essa escultura: altamente desejável, se você esquece do que é formado e o quão repugnante é.

Essa analogia esdrúxula foi a coisa mais próxima que consegui pensar do quão atraente e do quão repulsivo é o pecado. Por mais bela e maravilhosa que seja essa escultura descrita, você teria coragem de acariciá-la e abraçá-la, apenas pelo mero prazer de fazê-lo? Se você não está lendo isto vestido num pijama, entre os altos muros de uma colônia psiquiátrica, certamente responderá que não. Por que? Ora, porque é horrendo, nauseabundo, irracional. Uma demência completa! Acontece que fazemos isso com algo indescritivelmente mais nocivo e asqueroso. Por causa do pecado há fome, doenças, desespero e dor. Por causa do pecado, uma manga, aparentemente saborosíssima, que descasquei toda empolgada, com tanto gosto esta manhã, estava horrivelmente putrefata por dentro. Por causa do pecado, o Ser mais inocente, terno e amoroso do Universo foi humilhado, sofreu indizível agonia... até a morte! No entanto, enfiamos a cara, com a boca aberta, nessa escultura coprófila. Pois é, cometemos tamanha idiotice. E todos os dias!

Desde quando alguém decidiu que podia viver apartado de Deus, sugeriu isso aos nossos primeiros pais, eles acharam a idéia razoável e resolveram aderir, toda a raça (eu, tu, eles) foi contaminada por uma doença hereditária que a deixa suscetível a um vírus letal (Rm.5:1). Como nossos pais ficaram destituídos de Deus (Rm.3:23), não podiam transmitir naturalmente à prole o que eles mesmos não mais possuíam. Adquirimos, assim, a famigerada natureza pecaminosa.

Possuirmos natureza pecaminosa significa que se todos os anjos maus morressem hoje, ainda pecaríamos amanhã. Simplesmente porque essa é a nossa inclinação natural desde que estreamos neste mundo. Pecado, antes de ser um comportamento, é um estado. Uma condição. Uma condição hereditária, por tanto, nascemos com ela. Eu nasci na iniqüidade, e em pecado me concebeu minha mãe” (Sl.51:5). É a velha história “morrisvendiana”*: não somos pecadores porque pecamos, pecamos porque somos pecadores. Pecar (estado) é a conseqüência natural de nascer.

“Pecado é a transgressão da lei” (1Jo.3:4). Jesus resumiu essa lei em: Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo (Mc.12:28-31). Ou seja, Jesus resumiu a lei em relacionamento com Deus e relacionamento com o ser humano. Pecado, antes de regras rompidas, é relacionamento rompido. Como todos nós nascemos inimigos de Deus (Rm.5:10), destituídos dEle, nascemos em pecado. Por isso, a exclamação de Davi no Salmo 51:5.

Então, não há o que fazer! Estamos fadados a cometer a burrice de lamber aquela escultura nojenta até o fim de nossa existência!! De modo algum! Arquitetaram um plano.

A morte é o obvio salário de quem se permite “viver” apartado da Vida (Rm.6:33), a saber: Deus. “Nossos pecados fazem separação entre nós e Deus” (Is.59:2), assim, agarrando-nos ao pecado, agarramo-nos à morte. A lei foi transgredida, o salário óbvio de transgredir uma lei que protege a vida é a própria morte. A justiça de Deus abomina o pecado tão terrivelmente, ele é tão nocivo e tão contrário a Deus, que a morte é sua conseqüência natural. Ou seja, esse deveria ser nosso destino. Porém, arquitetaram um plano.

Diz certa lenda que uma série de furtos numa tribo foi tolerada durante muito tempo. Várias medidas foram tomadas, mas os furtos continuavam. Até que a situação se tornou insuportável e o chefe se viu obrigado a dizer: “A paz em nossa tribo tem sido roubada. Tal situação não pode continuar. Que os furtos parem agora, do contrário, quando for pego o perturbador, levará 40 chibatadas”. Apesar disso, mais um furto, esse, porém, teve flagrante. Chamaram então o chefe para dar a punição ao transgressor. Qual não foi sua surpresa ao deparar-se com o tão procurado bandido. Era sua idosa mãe! Ré flagrada e confessa. Toda a tribo esperava ansiosa para saber se o chefe cumpriria mesmo sua resolução. Ele, então, rasgou suas vestes, fez sinal ao verdugo que demorou a entender, mas, atônito, cumpriu seu papel. O chefe levou sobre si a pena.

Hans LaHondelle disse certa vez que “na cruz, Deus não aplacou sua ira contra o pecado, apenas desviou-a do homem e apontou-a contra Si mesmo”. Na cruz, Cristo se fez pecado por nós” (2Co.5:21). Não paramos para meditar na profundidade disso, mas ele agarrou-se àquela escultura não por amor a ela, como nós, mas por amor a nós. É como alguém que, para esgotar uma fossa cheia, precise mergulhar nela e até beber do seu conteúdo. “Em meio da horrível escuridão, aparentemente abandonado por Deus, sorvera Cristo as derradeiras fezes da taça da miséria humana” (O Desejado de Todas as Nações, p.756).

Como o pecado é a conseqüência natural de nascer, Cristo nos dá a solução: nasça de novo. Quando permitimos que o relacionamento rompido no Éden seja refeito em nós por meio do que Cristo fez, nascemos de novo, dessa vez, do Espírito. Deus nos vê, então, perfeitos, sem uma única mancha de pecado, pois quando permitimos que Cristo tome o nosso lugar, Ele apresenta a Sua vida perfeita no tribunal. Nossa vida fica escondida em Cristo.

Cristo foi tratado como nós merecíamos, para que pudéssemos receber o tratamento a que Ele tinha direito. Foi condenado pelos nossos pecados, nos quais não tinha participação, para que fôssemos justificados por Sua justiça, na qual não tínhamos parte. Sofreu a morte que nos cabia, para que recebêssemos a vida que a Ele pertencia. ‘Pelas Suas pisaduras fomos sarados’ Is.53:5” (Idem, p.25)

*Morris Venden, escritor estadunidense.

Vanedja Cândido